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Dia desses eu passeava com meu esposo que não gosta de ser chamado de gringo numa bela praia de Cabo Frio à noite. Era nosso segundo casamento e primeira lua-de-mel, história meio complicada mas muito romântica. O passeio estava muito agradável, o riso rolando solto e aquela sensação de que só nós dois existíamos naquele momento tão precioso. A brisa marítima vinha arrepiar os pelinhos dos braços e bagunçar o cabelo que o esposo tentava em vão tirar dos meus olhos. Fazíamos planos irretocáveis para o futuro ao som do saltinho da minha recém-comprada-sandália sendo arrastada preguiçosamente nas pedras do calçadão. Ah… que céu lindo, cheio de estrelas (que o esposo prometia uma por uma me dar), que delícia de brisa balançando o vestido florido, que cheiro de… churros recheados com doce de leite?
Apertei a mão do esposo e anunciei:
-- You’ve got to taste this!
Ali, no meio da praia, à noite e em pleno junho, quando Cabo Frio fica quase deserto, sem barraquinhas, sem parque, sem turistas… eu tive a visão do paraíso: uma barraquinha de churros!! O esposo estrangeiro iria conhecer o gosto da minha infância. Cinquenta centavos cada. Ainda tá quentinho? Sim. Capricha no doce de leite, moço!
Sentamos no banquinho cheio de terra. O esposo deu a primeira mordida meio sem jeito e fechou os olhos. A expressão do seu rosto disse mais que mil palavras estrangeiras poderiam um dia expressar. Satisfeita, voltei-me para o meu churro. Aquela textura, aquele aroma… Fase primeira: o tato. Lembrei-me das mãos macias da mãezinha segurando a minha, ajudando-me a descer do ônibus e atravessar a rua na rodoviária em direção à barraquinha de churros, Sempre a mesma. Eu, de uniforme, olhava com grandes olhos o moço escolher um bem grande, passar no açúcar e rechear com doce de leite. Verdade que quando se é criança tudo parece maior. Entrávamos em outro ônibus, sentávamos no “altinho” e saboreávamos juntas aquele presente bem devagarinho, para não acabar rápido.
O cheiro. Antes de se comer o churro é preciso inalar o seu aroma até que se fique com água na boca. Aí, sim. Aí pode se comer com gosto.
O sabor. E daí que foi frito sabe-se lá a que horas e em que circunstâncias? E daí se não é lá muito saudável? Quem se lembra desses detalhes uma vez que o churro derrete na boca, trazendo indescritíveis sensações?
Pronto. Findo. Uma lágrima de saudade escorre do canto dos olhos. Muitos cheiros, texturas e gostos me lembram a minha infância em Petrópolis, mas nada jamais se comparou aos churros recheados com doce de leite que eu comia em companhia de minha mãe. Viro-me para o esposo e qual não é minha surpresa ao vê-lo de volta na barraquinha, um Real na mão, olhos grandes, caprichando no português, a pedir mais dois.
Agora ele também teria do que se recordar quando, no futuro, avistasse uma barraquinha de churros.